terça-feira, julho 2, 2024

Polícia – Inédita sentença de “estupro culposo”, absolve empresário influente de estupro de vulnerável.

No mês de setembro, o empresário André de Camargo Aranha foi considerado inocente da acusação de estupro da jovem catarinense e promoter de eventos, Mariana Ferrer, de 23 anos, durante uma festa em 2018. Houve uma grande comoção nas redes sociais em virtude do caso.

De acordo com o promotor do caso, não teria como André Aranha saber, durante o ato sexual, que a vítima não tinha condições de consentir a relação, desse modo, não houve a “intenção” do acusado, de estuprar.

Em virtude disso, o juiz que julgou o caso acolheu o argumento de que o empresário cometeu “estupro culposo”, um “crime” que não é previsto por lei. André Aranha foi absolvido do caso, pois ninguém pode ser condenado por um crime que não existe.

O processo jurídico do caso foi marcado pela troca de delegados e promotores, sumiço de imagens, mudança de versão do acusado, a vítima sendo humilhada pelo advogado de defesa de Aranha, e por último, mas não menos importante, o veredito inédito do juiz.

VÍDEO DA AUDIÊNCIA:

O Intercept teve acesso às imagens da audiência, as quais mostram Mariana sendo humilhada pela defesa do empresário. Ainda foram apresentadas cópias de fotos sensuais da jovem enquanto era modelo profissional antes do crime acontecer, como meio de reforçar o argumento de que a relação havia sido consensual e não um estupro.

O advogado Cláudio Gastão da Rosa Filho analisa as imagens, as definindo como sendo “ginecológicas”, sem ser questionado sobre a importância delas em relação ao caso, e ainda afirma que “jamais teria uma filha” do “nível” de Mariana.

Ele também repreende o choro de Mariana: “não adianta vir com esse teu choro dissimulado, falso e essa lábia de crocodilo”.

A jovem se queixou do interrogatório ao juiz. “Excelentíssimo, eu tô implorando por respeito, nem os acusados são tratados do jeito que estou sendo tratada, pelo amor de Deus, gente. O que é isso?”, diz.

O juiz, Rudson Marcos, da 3ª Vara Criminal de Florianópolis, realizou poucas interferências, que ocorrem após as falas de Gastão. Em uma das ocasiões, o juiz avisa Mariana que irá parar a gravação para que ela possa se recompor e tomar água, além de pedir para o advogado manter um “bom nível”.

CONFIRA O VÍDEO ABAIXO:

https://youtu.be/X–JAQShBBw

ENVOLVIDOS:

Mariana tornou seu caso público em maio de 2019, por meio das redes sociais. Apesar do processo correr em segredo de justiça, ela fez isso como uma maneira de pressionar a investigação, que considerava parada devido à influência que Aranha exerce.

O acusado é filho do advogado Luiz de Camargo Aranha Neto, que já representou a rede Globo em processos judiciais, Aranha é empresário de jogadores e é visto com frequência ao lado de figuras como o ex-jogador de futebol Ronaldo Nazário e Gabriel Jesus. Na festa em que Mariana afirma ter sido estuprada, o empresário estava acompanhado de Roberto Marinho Neto, um dos herdeiros da Globo.

Mariana compartilhava as informações sobre o caso em seu perfil no Instagram, que foi removido pela rede social em agosto deste ano. Segundo ela, Aranha teria solicitado a remoção do conteúdo na justiça.

Aranha é defendido no processo por Cláudio Gastão da Rosa Filho, um dos advogados mais caros de Santa Catarina.

De acordo com Mariana, o estupro teria ocorrido na noite de 15 de dezembro de 2018, na festa de abertura do verão Music Sunset do beach club Café de la Musique, em Jurerê Internacional, em Florianópolis, uma praia conhecida por ser point de ricos e famosos.

Na época com 21 anos, Mariana trabalhava como promotora do evento, sendo responsável por divulgar a festa nas redes sociais.

Em um vídeo de câmera de segurança vazado na internet, Mariana aparece grogue subindo uma escada com a ajuda de Aranha em direção a um camarim restrito da casa. Eles sobem os degraus às 22h25 e seis minutos depois, ela desce, seguida de Aranha.

Só foi solicitado o material de forma oficial pela polícia ao beach club, meses após as investigações terem sido iniciadas. E, segundo a boate, o dispositivo de armazenamento exclui as imagens após quatro dias. Em virtude disso, não foi possível recuperar imagens das 37 câmeras de segurança. Mesmo assim, o vídeo vazado na internet foi incluído no processo.

Mariana afirmou através de seu depoimento à polícia, que sofreu um lapso de memória entre o momento em que uma amiga a levou para um dos camarotes do Café em que Aranha estava e a hora em que “desce uma escada escura”.

Ela acredita ter sido dopada e única bebida alcoólica anotada na comanda do bar em seu nome foi uma dose de gim.

Mariana era virgem e esse fato foi constatado pelo exame pericial. Porém tanto sua virgindade quanto sua manifestação nas redes sociais foram utilizadas pelo advogado do empresário, que alega que ela manipulou os fatos.

“Tu vive disso? Esse é teu criadouro, né, Mariana, a verdade é essa, né? É teu ganha pão a desgraça dos outros? Manipular essa história de virgem?”, disse Cláudio Gastão durante a audiência de instrução e julgamento.

INVESTIGAÇÃO:

O primeiro promotor a assumir o caso, Alexandre Piazza, denunciou André de Camargo Aranha em julho de 2019 por estupro de vulnerável, quando a vítima está sob efeito de álcool ou de algum entorpecente e não é capaz de demonstrar consentimento ou de se defender.

Foi requerida pelo promotor a prisão preventiva de Aranha, que foi aceita pela justiça e derrubada em liminar na segunda instância pela defesa do empresário. Aranha cumpriu apenas medidas cautelares como a apreensão do passaporte.

Piazza considerou como prova o material genético colhido na roupa de Mariana e um copo no qual Aranha bebeu água durante interrogatório na delegacia.

Também foi levada em consideração “as mensagens desconexas encaminhadas pela vítima aos seus colegas” após descer as escadas do camarim onde o crime ocorreu, além dos depoimentos de Mariana, de sua mãe e do motorista de Uber que a levou até em casa.

A mãe de Mariana, Luciane Aparecida Borges, afirmou que sentiu um cheiro forte de esperma quando a filha chegou em casa após a festa. Segundo ela, Mariana não costumava beber e nunca havia chegado em casa naquele estado.

O motorista citado na denúncia afirmou que a jovem passou a viagem chorando e falando com a mãe ao telefone. De acordo com ele, a vítima parecia estar sob o efeito de drogas.

Áudios enviados por Mariana a pelo menos três amigos após descer as escadas do camarim, foram anexados ao processo.

Em um deles, ela diz: “amiga, pelo amor de Deus, me atende, eu tô indo sozinha, não aguento mais esse cara do meu lado, pelo amor de Deus”.

O promotor pediu ainda que fosse averiguada a conduta do primeiro delegado que atendeu a ocorrência e não solicitou as imagens das 37 câmeras de segurança do clube.

O entendimento do Ministério Público sobre o caso mudou completamente na apresentação das alegações finais. De acordo com o MP, o promotor Piazza deixou o caso para assumir outra promotoria, e quem assumiu o processo foi Thiago Carriço de Oliveira. Nas alegações finais de Oliveira que aparece a tese do estupro “sem intenção”.

De acordo com o novo promotor, não foi possível comprovar a falta de capacidade de Mariana para consentir com o ato sexual, desqualificando assim o crime de estupro de vulnerável descrito na denúncia pelo seu colega.

Seu embasamento se refere aos exames toxicológicos não reconhecerem nem álcool e nem drogas no sangue de Mariana naquela noite e na aparente sobriedade indicada pela postura de Mariana ao sair do Café de la Musique e se deslocar até outro beach club em busca das amigas, captada pelas câmeras da rua, da Polícia Militar.

Em maio de 2019, André de Camargo Aranha negou em seu primeiro depoimento que teve contato com Mariana. Ao prestar novo depoimento em juízo, mudou sua versão e afirmou ter feito apenas sexo oral nela.

De acordo com o empresário, Mariana se aproximou dele e teria feito um carinho em seu cabelo. Após isso, ela teria pedido para ir ao banheiro, e teria sido nesse momento que eles subiram as escadas para usar o banheiro do camarim restrito. Ele então realizou sexo oral e depois deixaram o local por decisão de Aranha.

Após conceder o pedido de absolvição, o juiz Rudson Marcos concordou com a tese apresentada pelo promotor e afirmou que é “melhor absolver 100 culpados do que condenar um inocente”. A defesa de Mariana recorreu da decisão.


  • Fonte: The Intercept Brasil
  • Imagem: Reprodução das redes sociais

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