O ex-secretário de Saúde do Amazonas, Marcellus Campêlo, prestou depoimento nesta última terça-feira (15) à CPI da Covid-19, que investiga ações de negligência governamental durante a pandemia, dentre elas, o colapso hospitalar do estado e o desvio de verbas pertencentes à saúde pública, esse investigado na Operação Sangria da Polícia Federal.
Ele é suspeito de ter realizado contratações fraudulentas para favorecer empresários locais. As contratações seriam orientadas pelo governo do Amazonas. O governador do Estado Wilson Lima (PSC) também é investigado. Marcellus foi convocado para comparecer à CPI no dia 5 de junho.
A sessão foi aberta pelo presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM), por volta das 9h50. Os requerimentos que pediram a convocação de Campêlo foram apresentados pelos senadores Marcos Rogério (DEM-RO) e Alessandro Vieira (Cidadania-SE).
Durante a oitiva, contou que pediu ajuda ao então ministro da saúde, Eduardo Pazuello, na logística para transportar oxigênio de Belém para Manaus em 7 de janeiro, oficializou o alerta no dia 9 e comunicou o general pessoalmente no dia 10.
À CPI, Pazuello relatou a ligação do dia 7, mas disse que só teve conhecimento da crise do oxigênio no dia 10. Já à Procuradoria-Geral da República (PGR), o ex-ministro afirmou que soube do caso no dia 8.
“Sobre oxigênio, especificamente fiz uma ligação ao ministro Pazuello no dia 7 de janeiro, explicando a necessidade de apoio logístico para trazer oxigênio de Belém para Manaus, a pedido da White Martins”.
Perguntado sobre qual o retorno enviado pelo governo federal a esses comunicados oficiais do governo estadual, Campêlo disse que não recebeu uma resposta oficial.
O ex-secretário afirmou também que recebeu a secretária de Gestão do Trabalho e Educação do Ministério da Saúde, Mayra Pinheiro, em Manaus, no dia 4 de janeiro. Segundo ele, Mayra demonstrou “enfâse” em relação ao tratamento precoce e comentou sobre um novo sistema que seria apresentando, o aplicativo TrateCov.
À CPI, Marcellus Campêlo disse ainda que a tese da imunidade de rebanho nunca foi discutida no estado, ressaltou que apresentou ao ministro Marcelo Queiroga um plano de contigência para uma possível terceira onda e descartou uma pressão do governo federal para reabertura do comércio no Amazonas.
Contra a revogação do decreto de medidas restritivas:
Campêlo disse também que o governador Wilson Lima agiu por pressão popular, ao revogar o decreto que estabelecia medidas restritivas para conter a disseminação do novo coronavírus no Amazonas.
A iniciativa foi revogada em dezembro do ano passado, segundo Campêlo, mesmo sem a indicação da secretaria de saúde do Estado. Diante disso, senadores reforçaram as críticas ao governo estadual, por entender que Lima não poderia ter agido apenas porque houve uma insatisfação popular em torno do decreto.
“A posição da Secretaria de Saúde foi pela manutenção. O decreto é do governador… ele revogou”, disse ao ser questionado por ser posicionamento no episódio.
“O governador foi pressionado pela manifestação popular em relação, inclusive, à segurança pública no estado do Amazonas. Houve uma revolta generalizada, até com ateamento de fogo. As equipes de segurança tiveram que enfrentar os manifestantes”, completou.
Destacou apoio do Ministério da Saúde no transporte de oxigênio:
Ao ser perguntado por Randolfe Rodrigues sobre qual o apoio fornecido ao Amazonas pelo Ministério da Saúde no auge da crise de fornecimento de oxigênio, o ex-secretário de Saúde afirmou que foi um auxílio logístico, para o transporte do insumo.
“Nos dias 13 e 14 as equipes estavam do Ministério estavam todas informadas [da proporção da crise] (…) Eles estavam transportando oxigênio, ajudando a White Martins”, disse Marcellus Campêlo.
Todavia, o ex-secretário afirmou que essa ajuda não foi suficiente, visto que, segundo ele, “a demanda era muito maior”.
Por fim, afirmou que até alguns hospitais que possuíam contratos individuais com a White Martins. como o Hospital Getúlio Vargas, sofreram por falta de insumos.
Não tinha conhecimento do que era o TrateCov:
Marcellus Campêlo contou que a secretária de Gestão do Trabalho e Educação do Ministério da Saúde, Mayra Pinheiro, visitou Manaus para realizar o lançamento do aplicativo TrateCov, que recomendava o uso de medicamentos sem eficácia comprovada contra a Covid-19.
O senador Rodolfo Rodrigues perguntou se, na visão dele, o uso do aplicativo era ideal para aquele momento de colapso hospitalar no Amazonas, o ex-secretário afirmou que não sabia do que se tratava o aplicativo e que ele seria explicado naquela oportunidade. Segundo Campêlo, Mayra Pinheiro apresentou 150 teses sobre o tratamento.
“Ela recomendou que a gente adotasse, mas que ela ainda iria trabalhar na atenção primária, e isso foi feito com atenção básica contatando os municípios”, disse.
Desde setembro de 2020, White Martins alertava sobre a futura falta de oxigênio:
O senador Eduardo Braga (MDB-AM) apresentou uma nota enviada pela empresa fornecedora de oxigênio White Martins, no início de setembro, na qual alertava que estava funcionando em máxima capacidade e que as instalações não suportariam o consumo que estava sendo praticado na época.
Ele questionou Campêlo se o estado adquiriu usinas para suprir essa necessidade e mostrou que não houve nenhuma requisição nesse sentido pelo governo estadual, somente pelas prefeituras.
“Nesse momento, não estava sendo feito compra de usina de oxigênio. Lançamos edital de compra e eles foram fracassados”, disse o ex-secretário.
E então, o senador insistiu no questionamento: “Sabendo desde julho, desde setembro, que não tinha capacidade de abastecer o consumo hospitalar?”
“Senador, esse pedido da White Martins, nessa época, não compramos nenhuma usina.”
Braga, por fim, ainda o questionou sobre o atraso no pagamento do fornecimento de oxigênio no estado, o ex-secretário afirmou que esse era um problema crônico, de antes dele assumir a pasta.
“Quando eu assumi o cargo, essa questão do processamento de pagamentos era um problema crônico, com a própria White Martins havia dívidas de 2018, etc”, disse Campêlo. “Nós efetuamos, negociamos, parcelamos e pagamos e hoje temos uma regularidade em relação aos pagamentos da White Martins.”
De acordo com o ex-secretário, só faltou oxigênio em Manaus por dois dias:
O ex-secretário disse à CPI que, na rede estadual do Amazonas, houve interrupção do fornecimento somente em dois dias, em 14 e 15 de janeiro.
A afirmação foi rebatida pela senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA), que lembrou as cenas de amazonenses levando tanques de oxigênio nas costas nas portas dos hospitais.
Campêlo disse que isso pode ser atribuído à superlotação, mas que só faltou oxigênio nas instalações estaduais por dois dias.
Mais tarde, questionado pelo vice-presidente da CPI, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), sobre o mesmo ponto, Campêlo disse que era importante diferenciar entre o fornecimento no sistema público de saúde e no mercado geral.
“Senador, como eu falei, temos que diferenciar a crise nas unidades de saúde, por falta ou intermitência de oxigênio, e no mercado local. Nosso contrato com a White Martins é para a rede estadual”, disse o ex-secretário.
“Mas, de fato, [a falta do] oxigênio no mercado teve… foi até o final de janeiro (…) começou da data quando as unidades não tinham mais, no dia 14 – data crítica de fornecimento para as unidades – e se estendeu até o final [do mês], por uns 20 dias.”
Sobre o plano de contingência para enfrentamento à segunda onda de Covid-19:
O ex-secretário informou que em setembro de 2020 deu início à elaboração de um plano para enfrentamento do recrudescimento da pandemia.
“Esse plano foi elaborado pelas equipes técnicas da Saúde, junto com a Fundação de Vigilância em Saúde, ouvindo especialistas e em consonância ao Plano Nacional de Enfrentamento à Covid-19 e com todos os estados brasileiros. Era [um plano] em 5 fases, que disparavam quando a taxa de ocupação de UTIs Covid-19 ultrapassava 75% da sua capacidade”, explicou.
Campêlo afirmou que a segunda fase do plano foi acionada em novembro e a terceira em 23 de dezembro, o que obrigou a secretaria a pedir que o comitê de crise elaborasse um decreto de restrição das atividades e de circulação de pessoas no estado.
“A partir daí, não tivemos êxito nesse decreto. Chegou a ser publicado, mas houve muitas manifestações, inclusive com violência, com barricadas, com interrupção do direito de ir e vir da população, o que obrigou o governo a flexibilizar o decreto.”
Por último, fez um balanço de seus 10 meses de gestão:
“Estou aqui para honrar a memória dos profissionais da Saúde que lutaram e que ainda lutam no front da pandemia, os quais convivi durante os 10 meses de titularidade da Saúde do Amazonas. Com eles, desenvolvemos várias ações administrativas e principalmente um programa de Saúde no Amazonas”, disse Campêlo.
Ele afirmou que, depois que assumiu a pasta, primeiro como secretário-executivo, em maio de 2020, e, depois, de forma interina, em julho, trabalhou para reorganizar a gestão e elaborar um plano de Saúde para o estado.
- Fonte: O Convergente / G1 / Poder360 / Exame / CNN.
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