Neste último sábado (26), a equipe do Portal Manaós, após processo de reestruturação, voltou a apresentar o quadro semanal Por Elas, que vai ao ar todos os sábados, às 10h. E para primeiro encontro, a pauta escolhida foi do Mês do Orgulho LGBTQIA+, abordada pela entrevistadora Letícia Barbosa, em conversa com a professora da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) e ativista dos direitos humanos, Lidiany Cavalcante.
E juntamente com o Mês do Orgulho LGBTQIA+, nesta segunda-feira (28), o mundo celebra o Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA + (Gays, Lésbicas, Bissexuais, Transexuais e Pessoas Intersexo), a data tem como um dos objetivos conscientizar a população sobre a importância do combate à homofobia.
Primeiramente, Letícia traz à tona o questionamento do fato de que, em pleno século 21, tem aumentado cada vez mais os casos de violência e preconceito à comunidade LGBTQIA+.
A ativista respondeu à questão, separando em três fatores decisivos para a apresentação deste cenário.
“O Brasil é o país que mais mata a população LGBT, no mundo inteiro. Estamos no topo do ranking, e isso é preocupante. A cada 19 horas morre uma pessoa da comunidade, ou vítima de homicídio ou vítima de suicídio. Coloco vítima de suicídio, justamente porque o preconceito é um fator determinante para isso. E a pandemia proporcionou um aumento nesse cenário de violência, porque com essa questão do isolamento, do distanciamento, a população LGBT não se sente segura. E estar dentro de casa não se mostra nada seguro, nós temos um percentual de violência familiar contra pessoas LGBT muito alto. Outro dado interessante a ser debatido, neste contexto de pandemia, é a violência contra as pessoas transexuais. Dentro do universo LGBT, as pessoas transexuais sofrem muito mais preconceito. Segundo dados, por exemplo, no mês de agosto de 2020, primeiro ano da pandemia, os números de homicídios contra a população trans já tinha superado todo 2019. E o terceiro fator, é que estamos no século 21, mas parece que a nossa sociedade está regredindo para a Idade Média. Hoje a violência contra a pessoa LGBT está legitimada, temos um governo que apoia essa violência abertamente. Vivemos num país onde a vida dessa parcela da população importa muito menos”, destacou a ativista.
Ela ainda enfatizou o quanto a própria mídia negligencia a causa, ao se importar muito mais, e abordar de maneira diferente, a morte de uma pessoa de orientação heterossexual em comparação a de uma transexual. Destacou a importância de portais inclusivos, que tragam, a exemplo do Portal Manaós, coberturas de casos como o da Manuela Otto, vítima de homicídio e transfobia.
Por conseguinte, a entrevistadora destaca que a homossexualidade ainda é muito criminalizada, citando a questão da rejeição em massa de um beijo homossexual no cinema, em programas de tv, enquanto cenas mais “fortes”, de casais héteros, não são criticadas da mesma maneira. Lidiany comentou, baseada em fatos do cotidiano da pessoa LGBTQIA+.
“Primeira coisa importante a dizer, a homossexualidade sempre existiu desde que o mundo é mundo. Sempre falam que ‘está crescendo’ o número de pessoas gays, lésbicas, bissexuais, transexuais, pansexuais, e classificam até como uma ‘epidemia de diversidade sexual’. Mas não, isso tudo sempre existiu, desde a Grécia Antiga temos relatos de atividades homossexuais. Vale destacar também o uso da expressão ‘homossexualismo’, esse prefixo ‘ismo’ é usado na patologia, como se a orientação sexual fosse uma doença, e está muito errado usá-la. Ainda se tem essa ideia de que é crime, de que é errado, que um casal LGBT não pode criar um filho. E não é assim que funciona, falo isso como uma mulher lésbica, vinda de família de orientação heterossexual”, afirmou.
“Criamos uma sociedade de essência heteronormativa, vinda muito dessa questão do patriarcado. E temos um governo que incentiva isso, essa necropolítica, uma política de morte que decide quem merece viver e quem tem que morrer. Estão criminalizando a questão homossexual, sendo que na verdade, o crime é o preconceito. O STF já até fez esse julgamento, visto que o Legislativo se mostra completamente omisso, o mais conservador da história. Por isso, tem-se a importância do dia do orgulho LGBT, para reivindicar nossos direitos, nosso direito de viver. A sociedade precisa se transformar, precisa enxergar que a população LGBT existe, e que não quer tomar conta do mundo, apenas fazer parte dele. Essa é a luta”, complementou Lidiany.
Tratando de um contexto mais jurídico, Letícia relembra o caso do PL 122, de 2006, proposto pela deputada Iara Bernardi, no qual abordava a questão da criminalização do preconceito motivado pela orientação sexual. Este processo acabou sendo arquivado, depois de passar 8 anos sem aprovação no Senado. Seguindo esta linha, vem o questionamento se o Brasil realmente proporciona um amparo, do ponto de vista jurídico, para estas pessoas.
“Letícia, infelizmente não, nossa legislação não garante. O STF tem muita dificuldade para colocar essas ações em prática, justamente por termos um Legislativo muito conservador. Acaba que o Judiciário faz o papel do Legislativo. A própria questão da união homoafetiva demonstra isso, que foi proposta em 1996 e só aprovaram em 2011. Ainda temos dificuldade na questão do reconhecimento dessa violência, ao chegar numa delegacia, por exemplo. Por tudo isso, também temos uma dificuldade na caracterização de crimes ocasionados por lgbtfobia, muitas vezes caracterizados apenas como homicídio, no máximo um homicídio qualificado. Os dados são muito maiores do que divulgados, em decorrência deste sistema tão conservador”, respondeu a professora.
Letícia traz também a questão da violação do direitos humanos da população LGBT. E pergunta à professora, quais ela acredita que mais sejam violados.
“O direito à vida, o direito a ter uma família, esses são os mais violados. Essas pessoas são postas para fora de casa muito cedo, além de ter dificuldade em todas as áreas, como no mercado de trabalho, por exemplo. Precisamos reconstruir a sociedade, para que esta parcela da população tenha pleno direito à escola, a uma universidade, a uma pós-graduação. Esse processo realmente depende de nós mesmos”, disse Lidiany.
Por fim, Letícia questiona: “Quais situações devem ser realmente classificadas como homofobia? Quando essa parcela da população tem os seus direitos feridos?”
“Bom, acho que é uma questão de que, muitas vezes, o que se trata de uma brincadeira para um, não se trata de uma brincadeira para o outro. Dentro do universo LGBT temos termos que machucam. Nem todo gay quer ser chamado de ‘bicha’, nem toda mulher lésbica quer ser chamada de ‘sapatão’, e precisamos ter esse respeito. A homofobia é o ódio, o medo, a aversão às pessoas LGBT’s. Estamos em uma sociedade heterogênea, que precisa trazer à tona a questão da equidade. Somos pessoas que, mesmo sendo diferentes, precisamos ter os mesmos direitos”, finalizou a professora.
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- Fonte: da Redação.
- Foto: Divulgação.