Segundo a cartilha A educação que protege contra a violência, produzida pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) globalmente, cerca de 150 milhões de adolescentes entre 13 e 15 anos tiveram alguma experiência de violência, entre pares, dentro ou ao redor da escola. A Pesquisa Nacional de Saúde Escolar (PeNSE), 2015, do IBGE, focada em estudantes do nono ano do Ensino Fundamental, indicou que 14,8% de estudantes declararam deixar de ir à escola, pelo menos um dia, nos 30 dias anteriores à pesquisa, por não se sentirem seguros no caminho de casa para a escola ou da escola para casa e 9,5% porque não se sentiram seguros no ambiente escolar.
Os casos mais recentes de violência escolar no Brasil mostram um quadro que vem se agravando nos últimos anos. Segundo o relatório O extremismo de direita entre adolescentes e jovens no Brasil: ataques às escolas e alternativas para ação governamental, produzido por pesquisadores e ativistas dedicados à educação pública e à prevenção do extremismo de direita no país, durante o processo de transição governamental, aconteceram 16 ataques entre 2002 e 2022. Ao todo, 35 pessoas morreram e 72 sofreram ferimentos. Nos primeiros meses de 2023, novos casos foram registrados no país, entre eles, o ataque de um ex-aluno a uma escola em São Paulo, que deixou uma professora morta e quatro pessoas feridas; e o atentado à creche em Santa Catarina, que vitimou quatro crianças.
A pesquisadora e professora do Programa de Pós-graduação em Saúde da Criança e da Mulher (PGSCM) do Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz) Suely Deslandes classifica a violência nas escolas em três vertentes – violência contra as escolas, de depredação e ataques aos prédios escolares e a seus profissionais. Já a violência nas escolas reúne uma série de fatores, situações de bullying, de agressões entre membros da comunidade escolar e seu entorno. Por fim, ela menciona a violência da escola enquanto instituição social, que produz discriminações, e por vezes reforça um discurso de meritocracia que não leva em conta as realidades socioeconômicas de seus alunos. “Precisamos refletir acerca da política que é produzida pela escola enquanto sistema escolar. Esse ambiente inclui ou exclui? Ele atrai ou afasta meninos e meninas? É preciso descortinar e dar luz a esse diálogo, para que seja possível pensar estratégias de mudança,” explica Deslandes.
A violência no âmbito escolar tem influência sob todos, visto que tem se instalado de diversas formas, afetando a qualidade de vida pessoal e social, além de ocasionar males a saúde física e psicológica. Como respostas a essas diversas formas de violência no ambiente escolar, algumas estratégias de enfrentamento vêm sendo adotadas.
Segundo Suely Deslandes algumas experiências internacionais e nacionais têm se mostrado eficientes e têm servido de modelo para discussões de uma cultura de paz e de enfrentamento à violência escolar. “A cultura de paz fala sobre uma iniciativa não violenta, de justiça restaurativa, equidade social, um conjunto de pressupostos, inclusive políticos, na condução das relações de comunicação, democracia, participação e inclusão familiar. Esse espaço para diálogo e o cultivo da resiliência e da empatia são elementos-chave para que toda a comunidade escolar conviva de forma íntegra e respeitosa”, enfatiza.
Estratégias de enfrentamento
Como resposta à violência nas escolas, a Comissão da Criança, do Adolescente e da Pessoa Idosa, da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro em parceria com um grupo diverso de pesquisadores compondo uma equipe multidisciplinar, com a participação de pesquisadores do IFF/Fiocruz e da Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio de Janeiro, dentre outras instituições, se reuniram em um seminário, no mês de junho, para uma discussão acerca do tema. A iniciativa teve como objetivo desenvolver propostas baseadas em uma perspectiva de efetiva intersetorialidade entre as políticas públicas, entendendo que a violência nas escolas não é um problema isolado, mas uma questão complexa que exige uma abordagem abrangente e interdisciplinar.
Como membro do grupo, Suely Deslandes fez uma breve explanação sobre experiências que, embora circulem na mídia, têm se mostrado ineficientes, principalmente em países da Europa e nos Estados Unidos. “Implantar um sistema de policiamento em salas de aula, treinar professores para manobras militares, entre outas ações de militarização, são iniciativas fracassadas e ineficientes, pois aumentam o clima de medo, a discriminação, o racismo e os conflitos. Precisamos enfrentar a violência estrutural através da valorização do corpo docente, do olhar compassivo ao ambiente escolar, da inclusão familiar,” finaliza a pesquisadora.
- Fonte: Agência Fiocruz
- Foto: Marcelo Camargo / Agência Brasil