O depósito da Escola Municipal Indígena Uniawasap’i, na Terra Indígena Andirá-Marau, funcionou como sala de audiências judiciais nesta quarta-feira (17), terceiro e último dia do mutirão Mo’yha Aikawiano Hanuat Ko’i Pyt’awa Hap (Acesso a Direitos), coordenado pela Defensoria Pública do Estado do Amazonas (DPE-AM) e voltado à população Sateré-Mawé da região do Alto Marau, em Maués.
O mutirão iniciou na última segunda-feira (15) na comunidade Nossa Senhora de Nazaré, oferecendo serviços de documentação civil como emissões e retificações.
“Nós montamos uma sala de audiências improvisada aqui no estoque escola da comunidade. Estiveram presentes um membro da Defensoria Pública, um membro do Ministério Público e um do Poder Judiciário para que nós pudéssemos realizar as audiências dos casos que não puderam ser resolvidos de forma extrajudicial pelo cartório”, explicou a defensora pública Daniele Fernandes, coordenadora da ação.
Apenas cinco casos precisaram passar por audiência. “Essas ações foram de retificação para a exclusão do nome dos avós como pais em registro, com a inclusão do nome dos pais biológicos. Duas ações de óbitos tardios. Uma alteração de registro civil que estava com data de nascimento errada. E fizemos ainda um procedimento de coleta antecipada de provas para uma ação de adoção que posteriormente será ajuizada”, detalhou a defensora.
Segundo Daniele Fernandes, a presença do juiz e do promotor na comunidade Nossa Senhora de Nazaré, que fica a nove horas de barco da cidade de Maués, possibilitou que todas as situações fossem destravadas. “A presença in loco foi importantíssima porque as ações foram protocoladas hoje e foram sentenciadas hoje. As audiências foram feitas hoje e hoje mesmo o cartório emitiu as certidões”, observou.
O juiz Paulo Benevides, da 2ª Vara de Maués, destacou a participação do Judiciário como supervisor da atividade cartorária e articulador para que esta parte extrajudicial fluísse bem. “A maior parte das retificações e dos registros tardios foi feita administrativamente, como permite a Lei de Registros Públicos. Naqueles casos em que não foi possível, foi feita a ação judicial. Por isso estive aqui junto com a promotoria. Foi muito produtivo, pois conseguimos resolver as poucas ações que ficaram”, ressaltou o magistrado.
“Foi muito realizador ter vindo, porque nossa finalidade é dizer o Direito para jurisdicionado, na ponta. A gente exerce a função judicante destinada a pessoas. E esse mutirão colocou as pessoas mais do que nunca perto do Poder Judiciário, tanto do ponto de vista judicial, por meio das ações, quanto pela parte extrajudicial. Veja, uma como coisa simples como um registro de nascimento, que é feito em cartório de qualquer cidade, para o pessoal do Marau era difícil. Então, foi muito bom. Estou muito satisfeito com o resultado”, acrescentou Benevides.
O promotor Sérgio Roberto Martins Verçosa, da 2ª Promotoria de Justiça de Maués, é um estreante em mutirões em comunidades indígenas do município. Ele disse ter ficado contente e agradecido por participar do mutirão.
“Eu entendo que essa ação, capitaneada pela Defensoria Pública, traz dignidade a essa população. Resolvemos cinco casos que precisaram de audiência. Se não tivéssemos vindo, eu e o juiz, seria necessário que o processo fosse remetido ao MP para que fosse dado um parecer. Então, a vinda do Ministério Público e do Judiciário foi necessária para dar solução imediata ao que foi trazido aqui, sem que fosse necessário que eles tivessem que comparecer lá em Maués para uma audiência”, destacou o promotor.
“O bom de tudo isso é que várias pessoas hoje passaram a existir. Pessoas que sequer tinham a Certidão de Nascimento saíram da ação com todos os documentos. Isso é muito lindo”, finalizou Verçosa.
Pais verdadeiros no registro
Um dos casos judicializados e que foi solucionado rapidamente foi a retificação do registro de Jardeilson dos Santos Gastão, 22, que, além de solicitar a inclusão da etnia Sateré-Mawé no seu nome, pediu uma correção: que os nomes de seus pais verdadeiros fossem incluídos na Certidão de Nascimento.
Jardeilson havia sido registrado como sendo filho dos avós maternos. Isso porque os pais Jamilo dos Santos e Maria Celestina, à época, não tinham documentos e ele, criança, precisava iniciar os estudos.
Jamilo e Maria disseram estar felizes com a mudança no registro do filho. Jardeilson também demonstrou satisfação. “Agora estou muito feliz, porque na minha documentação consta os nomes dos meus pais verdadeiros, que nunca saíram perto de mim e eu nunca os abandonei”, declarou o jovem.
Outro caso que passou pelos órgãos foi uma adoção, cuja ação será judicializada pela DPE-AM. “Acolhemos uma antecipação de prova em uma adoção. O processo nem existe ainda, mas pessoas chegou dizendo que estava com a criança, que os pais biológicos queriam fazer a entrega e nós coletamos essas informações, dando agilidade que é tão cobrada hoje em dia”, destacou o promotor Sérgio Verçosa.
O mutirão no Alto Marau para emissão e regularização de documentos foi solicitado pelas lideranças da região e está sendo coordenado pelo Polo de Maués da DPE-AM, com a parceria de diversas instituições, entre elas: Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), secretarias estaduais de Justiça, Direitos Humanos e Cidadania (Sejusc) e de Segurança Pública (SSP-AM), Prefeitura de Maués, Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas (TJAM), Associação Puratig dos Indígenas Sateré Mawé do Município de Maués (APISMMM), Tribunal Regional Eleitoral do Amazonas (TRE-AM), Ministério Público do Estado do Amazonas (MPAM), Cartório Andrade, Receita Federal do Brasil (RFB), Distrito Especial Indígena Parintins (DSEI/PIN), Casa de Saúde Indígena (Casai) e Associação de Tuxauas dos Rios Urupadi, Miriti e Manjuru (Tumupe).
Serviços oferecidos:
- Emissão e retificação da certidão de nascimento
- Registro de nascimento tardio
- Emissão de RG e CPF
- Emissão de título de eleitor e alteração do local de votação
- Registro no CadÚnico para obtenção do Bolsa Família
Ao todo, 16 comunidades do Alto Marau foram atendidas. Em toda a região vivem pelo menos 10 mil pessoas, segundo a Tumupe.
Fonte: Defensoria Pública do Estado do Amazonas – DPE AM
Foto: Márcio Silva/DPE-AM