O teto constitucional, que deveria limitar os salários dos servidores públicos ao valor recebido pelos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) – atualmente fixado em R$ 46.366,19 –, parece ser apenas um número simbólico quando se analisa a remuneração de promotores e procuradores nos Ministérios Públicos estaduais. Segundo levantamento realizado pela plataforma DadosJus, da ONG Transparência Brasil, houve casos em que membros dessas instituições chegaram a receber até R$ 800 mil em um único mês entre 2023 e 2024.
O pagamento de auxílios, gratificações, indenizações e outros penduricalhos tem inflado os contracheques de integrantes do MP em todo o país. Uma apuração do portal Metrópoles, baseada em planilhas salariais compiladas pela Transparência Brasil, identificou que cinco unidades estaduais do MP efetuaram 687 pagamentos mensais superiores a R$ 100 mil nesse período.
Esses valores podem ser ainda mais expressivos, uma vez que nem todos os Ministérios Públicos fornecem dados completos. Em pelo menos uma unidade, não houve registros de pagamentos acima de R$ 100 mil, e outras 21 sequer apresentaram planilhas detalhadas.
Entre os casos mais emblemáticos estão os dos procuradores Judith Telles e Jair Quintas, ambos do Ministério Público do Amapá. Eles receberam, respectivamente, R$ 877 mil e R$ 501 mil ao se aposentarem. Essas cifras, segundo especialistas, costumam incluir pagamentos retroativos e indenizações acumuladas ao longo da carreira. No entanto, enquanto ainda estavam na ativa, ambos já recebiam acima do teto constitucional. Entre janeiro e fevereiro de 2024, Judith ultrapassou o teto em quase todos os meses, com remunerações que chegaram a R$ 87 mil. Quintas também acumulou meses com vencimentos superiores ao limite legal antes de se aposentar em agosto.
O Ministério Público do Maranhão lidera em número de supersalários. Foram 315 pagamentos mensais acima de R$ 100 mil, incluindo um caso em que uma promotora recebeu R$ 240 mil em maio de 2024. No Ceará, os valores também explodiram no fim do ano: em dezembro, 204 promotores e procuradores receberam cifras superiores a R$ 100 mil, alcançando até R$ 150 mil graças ao pagamento de indenizações e bônus.
Apesar das críticas recorrentes à existência dos chamados “supersalários”, os pagamentos continuam sendo realizados com base em brechas legais e interpretações flexíveis sobre benefícios e gratificações. Para especialistas, essa situação evidencia a necessidade urgente de revisão na estrutura remuneratória do funcionalismo público, em especial entre as carreiras de elite.