terça-feira, abril 22, 2025
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Seis Reais é o Troco da Humilhação: Quem Aguenta Pagar o Preço de Ser Pobre em Manaus?

Por Érica Lima

Seis reais. Parece pouco pra quem anda de carro com ar-condicionado, mas pra quem enfrenta o calor de 35 graus, o ônibus lotado, a chuva escorrendo pela janela quebrada e o atraso que compromete o salário do mês, seis reais é mais que uma tarifa, é o preço da humilhação diária de ser pobre em Manaus.

A partir desta semana, os manauaras começaram a pagar R$ 6,00 na passagem de ônibus. Um aumento de R$ 1,50 que parece ignorar a realidade de uma cidade onde o salário mínimo mal cobre o básico. Em um lugar onde o transporte público é deficiente, suado, lento e, muitas vezes, desumano, esse reajuste soa como tapa na cara de quem trabalha muito e vive com pouco.

Manaus tem hoje cerca de 2,2 milhões de habitantes, segundo o IBGE. E mais de 400 mil pessoas dependem diariamente dos ônibus para ir ao trabalho, estudar, cuidar dos filhos, buscar atendimento médico. Em troca, recebem ônibus sucateados, longas esperas nos terminais, atrasos constantes e a sensação de que o sistema só piora. Quem nunca ficou horas no sol ou na chuva esperando por um ônibus que simplesmente “não vem”?

E mais: como justificar uma passagem de R$ 6,00 em uma cidade com um dos piores índices de mobilidade urbana da região Norte, com IDH de 0,7, muito inferior ao de capitais como Florianópolis, Curitiba ou Belo Horizonte, que têm tarifas menores e sistemas de transporte mais eficientes?

Vamos às comparações:

• São Paulo cobra R$ 5,00
• Rio de Janeiro, R$ 4,70
• Salvador, R$ 5,60
• Belém, R$ 4,00
• Boa Vista, R$ 3,95
E Manaus, a capital do Amazonas, quer nos convencer de que R$ 6,00 é justo?

O mais revoltante é que esse aumento veio no domingo de Páscoa e logo após semanas de greves dos rodoviários, frota reduzida nas ruas, ônibus quebrados circulando e o Ministério Público pedindo mais transparência sobre os dados que justificariam o reajuste. E mesmo com manifestações contrárias, a Prefeitura bateu o martelo. Para o prefeito David Almeida, talvez o povo esqueça rápido, afinal, em ano eleitoral, a memória popular costuma ser seletiva. Mas subestimar a dor de quem acorda às 4h da manhã pra tentar entrar num ônibus superlotado é um erro que pode custar caro.

Este não é só um aumento de tarifa. É o reflexo de uma cidade onde o trabalhador paga caro para continuar sendo explorado. Onde andar de ônibus virou um teste de resistência física, emocional e financeira. Onde a dignidade se perde a cada buzina, a cada fila interminável, a cada dia que se passa tentando sobreviver com um salário mínimo e o transporte que nunca chega.

Seis reais é o que custa a passagem, mas o que está sendo cobrado é muito mais. É a paciência de um povo que já vive no limite. É a dignidade de quem, mesmo exausto, ainda acredita que merece mais.

A pergunta é: até quando?

Quem é Érica Lima?

Érica Lima é diretora executiva do portal de notícias O Convergente e apresentadora do programa Debate Político, transmitido pelo canal 8.2 da Rede Onda Digital e pelo canal do YouTube @oconvergente. É mestre em Saúde, Sociedade e Endemias na Amazônia e especialista em Pesquisa Eleitoral e Análise do Discurso. Atuou como colaboradora em projetos de pesquisa na Fiocruz e no Ministério da Saúde, com expertise consolidada no trabalho com comunidades ribeirinhas e indígenas. Integra a Associação de Jornalistas e Escritoras do Brasil – seção Amazonas (AJEB-AM) e possui mais de uma década de experiência, incluindo atuação como professora de nível superior.

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Érica Barbosa
Érica Barbosa
Assistente social, Prof.a mestra em saúde, empresária e pesquisadora
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