Nos últimos dias, o posicionamento da bancada federal do Amazonas na Câmara dos Deputados em relação à votação da minirreforma eleitoral tem repercutido. Isso porque sete dos oito deputados votaram a fazer do texto-base, na última quarta-feira (13), que tem como um dos pontos a redução das cotas femininas. O único deputado que votou contra a minirreforma foi Amom Mandel (Cidadania) e afirmou que a aprovação traz um “retrocesso na legislação eleitoral”.
O Projeto de Lei nº 4438 de 2023, que agora segue para o Senado, institui uma série de modificações e flexibilizações em normas eleitorais. Entre os pontos, os partidos podem deixar de cumprir a disposição de cotas para candidaturas femininas. Se aprovado, a redução para as mulheres na política pode ser inferior a 30%, porcentagem disponibilizada atualmente.
Para o deputado federal Amom Mandel, é “inadmissível” que o Parlamento aprove a minirreforma que, na opinião dele, traz uma série de retrocessos para o Brasil. Em relação à redução das cotas femininas, o parlamentar destacou que é necessária representação e diversidade nas Casas Legislativas, o que pode mudar com a aprovação da minirreforma.
“É um retrocesso descomunal. É inadmissível que o Parlamento aprove esse tipo de coisa, porque nós precisamos, por definição, que no Parlamento Brasileiro tenhamos representações proporcionalmente ao que a população pensa. Ou seja, precisamos de diversidade de opiniões de pessoas”, disse.
Ainda, segundo ele, a minirreforma abre uma brecha para que parlamentares que usam ‘caixa 2’ possam sair impunes.
Com o voto contrário de Amom, o requerimento de urgência da minirreforma eleitoral teve o voto a favor dos deputados Capitão Alberto Neto (PL), Sidney Leite (PSD), Saullo Vianna (UB), Silas Câmara (Republicanos), Atila Lins (PSD), Fausto Júnior (UB) e Adail Filho (Republicanos).
Retrocessos
Para a ativista política Michelle Andrews, a minirreforma também é um retrocesso. “A chamada “minirreforma eleitoral” é tudo, menos “mini”. Ela traz consigo retrocessos significativos, especialmente para mulheres negras, LGBTQ+ e outros grupos minorizados”, disse. De acordo com ela, o posicionamento da bancada amazonense na votação reflete “a falta de sintonia com a contemporaneidade”.
“É lamentável que esses representantes não estejam dialogando com a realidade atual, apesar das estatísticas, relatos, pesquisas, grupos de estudo e trabalho que evidenciam o baixo nível de representação política de mulheres e questões étnicas no país. A política ainda carece de diversidade”, afirmou.
Andrews ainda comentou ao O Convergente que a minirreforma, no geral, “é um reflexo da mentalidade arcaica de muitos políticos, que ignoram a necessidade de cotas para mulheres e minorizados e ferramentas para uma participação mais inclusiva”.
Em relação aos votos a favor dos políticos do Amazonas, a ativista não se surpreendeu. “[Na semana] do Dia Internacional da Democracia, essa votação simboliza retrocessos significativos. São homens que não estão se adaptando à realidade diversificada que um parlamento deveria representar em termos de gênero e questões étnicas”, finalizou.
Sem expectativas para defesa feminina
Para o analista político Helso Ribeiro, o posicionamento da maioria dos deputados federais do Amazonas não é surpresa, uma vez que não há mulheres na bancada do Estado, tanto na Câmara quanto no Senado.
“Em relação específica da nossa bancada [do Amazonas], não dá para esperar você pegar mamão na goiabeira. A nossa bancada é composta só de homens, não é muito fácil encontrar homens que defendam os interesses das mulheres. Você encontra, mas não é isso. Dos oito deputados, sete votaram favoráveis à aprovação da reforma”, disse.
Ribeiro ainda comentou que “não dá para esperar milagre”, uma vez que, na prática, a defesa dos direitos das mulheres não é exercida. “Se você for ver, todos vão dar uma justificativa, mas, na prática, é isso. O Amazonas tem 11 parlamentares em Brasília, 3 senadores e 8 deputados, todos homens. Então não dá para esperar milagre daí”, pontuou.
O especialista também explicou ao O Convergente que, apesar da repercussão, é necessário manter a calma, uma vez que o texto seguiu para o Senado e ainda deve ser analisado, por isso, é necessário acompanhar como a Casa vai tratar a minirreforma eleitoral. “A gente não sabe se no Senado vai ter regime de urgência ou não. Se não tiver, não tem como promulgar essa reforma ou esse puxadinho até o dia”, disse.
Em relação às cotas femininas, Ribeiro acredita que não será positiva para o Brasil, que deve ficar na última posição do continente em representatividade feminina no Parlamento, caso o PL seja aprovado.
“O país que tem menos mulheres nos Parlamentos é o Brasil. Eu acho que essa reforma está vindo, no que tange ao dinheiro destinado às mulheres e à possibilidade das federações e não dos partidos membros das federações indicarem mulheres, ela está fazendo com que o Brasil permaneça nessa última colocação”, afirmou.
Caixa 2
Outro ponto que foi bastante debatido pelo deputado do Amazonas, Amom Mandel, foi a utilização do caixa 2, que passaria a ser “normalizado” com a aprovação da minirreforma.
Em explicação para O Convergente, Helso Ribeiro pontuou que qualquer parlamentar diz ser favorável sobre o uso, mas que não acredita que a minirreforma vá ajudar no caixa 2.
“Eu não vejo que essa reforma tem ferramentas para ajudar o caixa 2. Inclusive, a prestação de contas parcial que, atualmente, os partidos e candidatos têm que fazer, com essa minirreforma, ela acaba. Então, ela facilita ainda mais que você utilize lá na frente dinheiro que você não tinha, o então caixa 2”, afirmou.
Positivo X Negativo
Ao Convergente, o analista ainda falou sobre os prós e contras da minirreforma eleitoral aprovada por grande parte da bancada do AM. Conforme ele, em 2021, o Brasil também passou por uma reforma, no entanto, a que se discute atualmente no Congresso é menor do que a anterior.
“Ela largou mais os crimes políticos contra as mulheres, que nesse ponto é positivo. E tem vários pontos negativos também. Eu penso que o fato de você tirar a obrigatoriedade dos partidos terem 30% pelo menos de candidaturas de um sexo, no caso feminino, eu penso que não é interessante”, comentou.
Helso Ribeiro disse que concorda com a ideia dos partidos que não atingirem o consciente eleitoral não terem direito às cadeiras, uma vez que diminui a pluralidade das siglas no Brasil, mas discorda que o dinheiro destinado às candidaturas femininas possa ser usado por homens e diz que é “conversa para boi dormir”.
“A questão da marcação, da inelegibilidade a partir do momento da condenação e não do cumprimento após o mandato, eu acho que é para beneficiar os políticos. Então, eu diria que têm pontos que, de fato, devem ser adequados à realidade, e outros que você vê que é político legislando para eles mesmo”, frisou.
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*Com informações do O Convergente
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Da Redação
Ilustração: Marcus Reis