sexta-feira, novembro 22, 2024

Artigo- Sistema Prisional: Um aliado das facções ou do poder público?

Muitos afirmam que bandido bom é bandido morto! Eu digo que o bom seria se não houvesse bandido, se não houvesse crime, se não houvesse violência, se não houvesse pena.

O declínio do sistema prisional brasileiro atinge não somente os apenados, mas também as pessoas que estão em contato com essa realidade carcerária de forma direta ou indireta. O sistema prisional brasileiro tem o objetivo de fazer a ressocialização e a punição da criminalidade.

Assim sendo, o Estado possui a responsabilidade de combater os crimes, isolando o criminoso da sociedade, através da prisão, o mesmo é privado da sua liberdade, deixando de ser um risco para os que ficam do lado de “fora”.

Conforme Foucault o sistema prisional possui os seguintes objetivos:

-Fazer da punição e da repressão das ilegalidades uma função regular, extensiva à sociedade;

-Não punir menos, mas punir melhor; punir talvez com uma severidade atenuada, mas para punir com mais universalidade e necessidade;

-Inserir mais profundamente no corpo social o poder de punir.

A medida de ressocialização passa a ser uma utopia diante da atual realidade do “punir e vigiar” como bem falou Foucault em sua relevante obra. Nesse espaço a humanidade e as relações sociais são definidas pelo poder, medo e gerenciamento de conflitos. O presídio é uma panela de pressão preste a explodir “lombra”.

O sistema carcerário está precisando cumprir a legalidade, tendo em vista, que os presídios se tornaram grandes aglomerados depósitos de pessoas. Na atualidade estamos vivendo uma verdadeira cena de guerra, provocada na sua grande maioria por facções criminosas que já dominam todos os presídios brasileiros.

É comum vermos em noticiários confrontos entre facções criminosas dentro e fora das penitenciárias, confrontos estes que provocaram centenas de mortes e vários outros crimes. O crime se organiza através de facções, famílias e comandos.

As facções vivem em constantes disputas pelo comando dos presídios e tráfico de drogas. Nos presídios estas facções impõem suas próprias regras, a qual os detentos se submetem ou resistem aliando-se a outras facções, correndo o risco de morte.

Na lei, só cabe ao Estado o direito de punir, conforme a Constituição Federal de 1988, vigente em nosso país. Entretanto, o que se ver no dia a dia são organizações criminosas desempenhando também este papel, fazendo uma espécie de “terceiro Estado”, o que contraria o ordenamento jurídico pátrio.

A ousadia das organizações criminosas é tão grande que, implantam suas próprias leis e é até previsto a pena de morte para certos tipos de casos.

Vamos entender melhor:

  • O Comando Vermelho

A facção Comando Vermelho foi inspirado nas organizações da luta armada, incluindo-se também táticas de guerrilha urbana e rigidez de comando, o Comando Vermelho se originou no Rio de Janeiro, em meados de 1980, tendo como ambiente de criação e proliferação da facção o Instituto Penal Cândido Mendes.

“O instituto Penal Cândido Mendes, na Ilha Grande, localizado no litoral sul do Estado do Rio, conhecido como “Caldeirão do Diabo”, em uma referência ao presídio de Caiena, na ilha do Diabo, Guiana Francesa, foi ambiente propício para a criação e proliferação desta facção criminosa.” (PORTO, Roberto, 2008, p.86).

Carlos Amorim, em sua obra, O Comando Vermelho, afirma que esta facção surgiu devido a junção de presos políticos com presos comuns, o que chama de grave erro dos responsáveis pela segurança pública à época.

“O governo militar tentou despolitizar as ações armadas da esquerda tratando-as como “simples banditismo”, o que permitia também uma boa argumentação para enfrentar as pressões internacionais em prol de anistia e contra as decisões de tortura. Nivelando o militante e o bandido, o sistema cometeu um grave erro. O encontro dos integrantes das organizações revolucionárias com o criminoso comum rendeu um fruto perigoso: o Comando Vermelho.” (AMORIM, Carlos, 1993, p.19).

Roberto Porto, na mesma linha, expõe que o Comando vermelho é resultado da junção de presos políticos com presos comuns. “O estabelecimento, construído para abrigar 540 presos, em 1979, contava com 1.284 homens. O resultado óbvio: a convivência entre militantes de esquerda e criminosos, enfrentando um sistema penal desumano, acabou gerando o Comando Vermelho.

Dos presos políticos, a facção incorporou a ideologia e a organização, aliada as técnicas da guerrilha urbana.” (PORTO, Roberto, 2008, p.87). Esta facção teve vários fundadores, mencionam Porto alguns nomes. “São fundadores do comando Vermelho os detentos José Carlos dos Reis Encina, o “Escadinha”, Francisco Viriato de Oliveira, o “Japonês”, José Carlos Gregório, o “Gordo” e William de Silva Lima, o “Professor””. (PORTO, Roberto, 2008, p.87). A principal atividade criminosa do Comando vermelho é o tráfico de drogas, tendo também como atividade criminosa e o contrabando de armas.

  • A Família do Norte (FDN)

Família do Norte (FDN) Em 2006, em Manaus (AM), surge da aliança entre dois ex-rivais do mundo do tráfico de Manaus, José Roberto Fernandes Barbosa, o “Compensa”, e Gelson Carnaúba, o “G”, a facção criminosa Família do Norte (FDN).

Segundo a revista ISTOÉ, esta facção surgiu devido a convivência com membros do Comando Vermelho (CV) e Primeiro Comando da Capital (PCC), o que os determinou a criação desta nova facção. “A FDN surgiu em 2006 da aliança entre dois ex-rivais do mundo do tráfico de Manaus.

Jose Roberto Fernandes Barbosa, conhecido como “Compensa”, controlava a venda de drogas na região Oeste da cidade, enquanto Gelson Carnaúba, o “G”, dominava a região Sul. Presos, ambos cumpriram pena em presídios federais, onde tiveram contato com membros do CV e do PCC, e de lá voltaram determinados (ou orientados), segundo a Polícia Federal, a estruturarem uma operação nos moldes das facções do eixo Rio-São Paulo”. (Revista ISTOÉ, Os donos do crime, edição n° 2456 06/01/2017. https://istoe.com.br/os-donos-do-crime/).

Afirma-se que a facção cresceu muito e logo, logo dominou quase toda rota tráfico de drogas, conhecida coma a rota “Solimões”, que fica na região da fronteira entre Brasil, Peru e Colômbia. “Não demorou para o negócio decolar. Em pouco tempo, dupla dominou quase toda a rota “Solimões”, na região da fronteira entre Brasil, Peru e Colômbia, e passou a escoar grandes quantidades de cocaína para vender em Manaus, distribuir pelo Brasil e exportar para a Europa”. (Revista ISTOÉ, Os donos do crime).

A revista ISTOÉ expõe que, atualmente, a FDN é a terceira maior facção criminosa do Brasil, e tem como maior rival a facção paulista PCC, o que fez com que a mesma se aliasse com o CV.

O grupo nunca escondeu que, nesse esforço organizacional, suas inspirações foram o Comando Vermelho (CV) e, fundamentalmente, o Primeiro Comando da Capital (PCC), hoje seu maior rival”. (Revista ISTOÉ, Os donos do crime). Esta facção ficou conhecida nacionalmente no ano de 2017, após comandar a execução de 56 presos ligados ao PCC, durante rebelião no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj), em Manaus-AM.

Foi considerado o maior massacre dentro de uma prisão desde 1992, quando a casa de Detenção de São Paulo, conhecido como Carandiru, foi invadida durante uma briga e 111 detentos foram mortos. Aponta-se como líder atual desta facção José Roberto Fernandes Barbosa, o “Compensa”, o qual também é fundador da mesma e cumpre pena em Catanduvas (SC).

Várias rebelião marcaram a cidade de Manaus, essas práticas de violência se tornaram constante. Tivemos na última rebelião o número total de 37 mortos e de acordo com o IML, a maioria das vítimas foi identificada no Instituto Penal Antônio Trindade (Ipat), com 27 mortos.As outras mortes foram no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (5), Unidade Penitenciária do Puraquequara (4), além de uma vítima no Centro de Detenção Provisória Masculina (CDPM).

A crise no sistema penitenciário brasileiro possui causas estruturais. Portanto, deve ocorrer  a atuação coordenada de todos os poderes constituídos, adotando-se medidas de política estatal, de política criminal, bem como de política penitenciária, com a finalidade de evitar a prática de infrações penais, o que refletirá sobre o número de presos que fazem parte do sistema carcerário. O encarceramento em massa não é solução e só servirá para propiciar as facções criminosas mais detentos a serem recrutados para a escola do crime.

Manaus passou recentemente por mais momentos tensos e violentos, pois o Comando Vermelho tomou os territórios da Família do Norte. Foram noticiadas em um só dia uma sequencia de execução nas seis zonas da cidade. Como medida de emergência o poder público acionou o Gabinete de Crise para colocar o sistema de segurança em alerta para combate ao tráfico de drogas no Amazonas.


 

  • Redação Portal Manaós
  • Imagem: Divulgação

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