quinta-feira, novembro 21, 2024

Vacina BCG não protege profissionais da saúde contra Covid-19

A BCG foi originalmente desenvolvida para prevenir a tuberculose e é aplicada em mais de 130 milhões de recém-nascidos anualmente

Um estudo internacional conduzido em vários países sobre os benefícios do reforço imunológico da vacina contra a tuberculose, a BCG, revelou que ela não protege profissionais da saúde contra a Covid-19. O estudo Brace, liderado pelo Instituto de Pesquisa Infantil Murdoch e publicado nesta quarta-feira (26/4) na New England Journal of Medicine, testou se o imunizante poderia proteger os profissionais de saúde nos seis primeiros meses após a vacinação. No Brasil, ele foi conduzido pela Fiocruz.

A BCG foi originalmente desenvolvida para prevenir a tuberculose e é aplicada em mais de 130 milhões de recém-nascidos anualmente. O estudo Brace foi desenvolvido com base em uma pesquisa anterior que demonstrou que a BCG aumenta a imunidade inata, aquela que é inespecífica em relação ao patógeno, em crianças e protegeu adolescentes e adultos de infecções respiratórias. Esperava-se que a vacina pudesse ser reposicionada temporariamente até que vacinas específicas para a doença pudessem ser desenvolvidas e testadas.

Os resultados apresentados na New England Journal of Medicine fazem parte da segunda fase de um estudo randomizado e envolveu 3.988 dos quase 7 mil profissionais de saúde inscritos em 36 locais de Austrália, Holanda, Reino Unido, Espanha e Brasil. O Centro Médico Universitário de Utrecht (Holanda), a Universidade de Exeter (Reino Unido) e a Fiocruz ajudaram a supervisionar as pesquisas em seus países.

O risco de desenvolver Covid-19 sintomática foi de 14,7% no grupo vacinado com a BCG, e de 12,3% no que recebeu placebo nos seis meses de seguimento após a inclusão no estudo. A pesquisa não conseguiu determinar se o imunizante reduziu as hospitalizações ou morte devido aos baixos números de participantes com Covid-19 grave.

O professor Nigel Curtis, do Instituto Murdoch e da Universidade de Melbourne, pesquisador-chefe do estudo, explicou que a observação um pouco mais frequente da Covid-19 sintomática no grupo imunizado com a BCG pode ser explicada por uma resposta imunológica mais forte induzida pela vacina.

“Quando analisamos as células imunes dos nossos profissionais de saúde, vimos que a BCG alterou a resposta imunológica à Covid-19”, disse. “Os sintomas refletem o sistema imunológico trabalhando duro para combater o vírus. Uma resposta mais forte induzida pela BCG poderia ser benéfica ao matar o vírus mais rapidamente e proteger contra uma progressão para uma forma mais grave. Há algumas evidências disso em participantes do estudo com mais de 60 anos, os sintomas da Covid-19 parecem ser menores no grupo vacinado com a BCG”.

No Brasil os pesquisadores Julio Croda, da Fiocruz Mato Grosso do Sul, Margareth Dalcomo, da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp/Fiocruz), e Marcus Lacerda, da Fiocruz Amazônia, participaram do estudo, que contou com profissionais de saúde de Campo Grande, Rio de Janeiro e Manaus. Croda explicou que a maior parte dos casos de Covid-19 sintomática no estudo foi registrada no Brasil

“Isso demonstra o fardo pesado da doença no Brasil durante a pandemia. Embora a BCG não proteja contra a Covid-19 sintomática, vamos usar os dados para analisar também se ela protege os profissionais de saúde para infecção da tuberculose latente. É uma questão em aberto, especialmente para populações que correm alto risco de contrair a doença”, disse.

Segundo Nigel Curtis, como as vacinas contra Covid-19 foram desenvolvidas rapidamente e os profissionais da saúde foram priorizados nas campanhas de vacinação, foram recrutados menos participantes do que o originalmente previsto. Como resultado, com menos casos, a equipe não pôde investigar se a BCG protegeu contra hospitalização e morte.

Um estudo liderado pelo Instituto Murdoch, publicado na revista Clinical & Translational Immunology no ano passado usando amostras de sangue de participantes do Brace, também mostrou que a BCG, de fato, forneceu uma resposta imune consistente com proteção contra a Covid-19 severa.

O professor John Campbell, da Universidade de Exeter e que liderou a pesquisa no Reino Unido, disse que o estudo representou uma oportunidade importante de testar o potencial da vacina BCG. “As descobertas levantam questões importantes sobre como a BCG pode modificar o curso de diferentes doenças virais e nos permitem desenvolver uma compreensão mais completa se a vacina pode fornecer proteção contra uma série de infecções além de seu alvo principal, a tuberculose”, disse.

Segundo os pesquisadores, a análise dos dados ainda está em andamento, com resultados adicionais sobre os efeitos da BCG previstos para o final do ano, incluindo o impacto da vacina em outras infecções, como doenças respiratórias e nas respostas à vacina Covid-19. A equipe de pesquisa usa também as amostras de sangue dos participantes para tentar descobrir biomarcadores para o risco de Covid-19.

Doações

As doações para o estudo Brace incluíram uma verba de R$ 26,4 milhões da Fundação Bill & Melinda Gates, R$ 1,04 milhões de Sarah e Lachlan Murdoch, R$ 598 mil do Royal Children’s Hospital Foundation, R$ 2,2 milhões da Minderoo Foundation, R$ 299 mil do Governo da Austrália Meridional e R$ 374 mil da Fundação Peter Sowerby, do Reino Unido.

Instituto Murdoch de Pesquisa Infantil

O Instituto Murdoch de Pesquisa Infantil é a maior instituição de pesquisa de saúde infantil na Austrália, comprometido em fazer descobertas e desenvolver tratamentos para melhorar a saúde de crianças e adolescentes no país e em todo o mundo. É pioneiro em novos tratamentos, testando melhores vacinas e melhorando formas de diagnosticar e ajudar bebês, crianças e adolescentes. É um dos poucos institutos de pesquisa na Austrália a oferecer testes genéticos em busca de respostas para famílias de crianças com doenças não diagnosticadas.


  • Fonte: Portal Fiocruz.
  • Foto: Divulgação.

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